01/09/2007

Francisco Rocha Vieira 17/06/28 - 31/08/92


Pai, fez 15 anos que faleceste, e não encontro melhor forma de te prestar homenagem do que aqui neste meu espaço, eu sei que lerão estas palavras as pessoas que tu querias, que tu mais amavas.
Ficaste
órfão de pai com 4 anos, tiveste uma infância difícil de fome e privações de tudo, a avó Adelina ficou com 4 filhos e tinha de trabalhar para os sustentar fazendo renda de bilros, fizeste a 4ª classe e passaste com distinção, e de tal maneira que como andavas sempre descalço te ofereceram como prémio umas "alpercatas". Foste muito cedo para o mar e foi sempre essa a tua vida, tirando o serviço militar que também cumpriste. Lembro-me pai quando era pequeno de ir levar o farnel á Ribeira, mandava-me a mãe pois tu não vinhas a casa, era uma "arrasa" de chicharro e era descarregar até tarde e depois ir logo para o mar, eram quase 24 horas a trabalhar, que vida ingrata pai. Por isso, por passares o que passaste não quiseste que eu fosse para o mar e tu e a mãe fizeram o sacrifício de me pôr na Escola Industrial onde tirei o Curso Industrial, obrigado pai, sem quereres ensinaste-me o que era democracia e ditadura, com a simplicidade dos teus gestos e dos teus gostos, eras um HOMEM simples, nunca poderias conviver com holofotes, esse não era o teu timbre, antes querias ver o mar pela manhã, conviver com os teus amigos e companheiros de profissão já durante a reforma no Portão de Peniche de Cima onde hoje estão ainda alguns do teu tempo. Deste-me exemplos de que eu não esqueço, na maneira como ajudas-te a educar os teus netos, a paciência que demonstravas para eles e o carinho, eles também não o esquecem. Conversámos menos do que aquilo que devíamos, não havia muita oportunidade, talvez um dia, quem sabe, possamos pôr a conversa em dia, fazes-me falta pai.
Até sempre.

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Quiiinze? Eu tenho é o dezanove…
Os anos passaram depressa, afinal. Quinze. “Quiiinze?”, perguntaria a avó com aquele tom que nos desarma sempre, obrigando-nos a rir a bandeiras despregadas mesmo quando a situação é de pesar. Como parece ser o caso. Ou talvez não seja tanto assim. Ora vejamos: O “caso” conta-se rapidamente e sem rodeios. É que não estás por cá, entre nós quero eu dizer, há 15 anos. O que às vezes se enovela na minha garganta sob a forma de nó triste.
Não estás. E como tal, não te ouvimos as palavras-mundo cheias de simplicidade aparente. Não te notamos a presença sempre discreta mas absoluta. Não te vemos o sorriso rasgado de par em par nem encontramos os solavancos da tua barriga redonda, provocados pelas gargalhadas que disparavas. Não te tocamos as rugas fundas do rosto crestado, como marcas de cordas na areia. Não te cheiramos os dedos amarelados de um tabaco ténue.
Deixei de me “baldear” às cartas porque desde os 13 não jogo à sueca. Deixei de ter parceiro para combinar truques de trunfos na mesma altura em que decidi assumir que, afinal, não tinha cócegas (o gozo da nossa brincadeira residia nisso mesmo, no facto de ser a nossa brincadeira). Já nem sequer aprecio filmes de capa e espada, embora continue a comer meloa e a gostar dela doce. Como tu.
Bem, se eu quiser ser sincera comigo (e é só isso que interessa), tenho que admitir que não deixaste de estar mas apenas de ser. A verdade é que te sinto comigo desde então. Não direi que és anjo, pois acho que não me perdoarias a atoarda. Também não és brisa celestial ou murmúrio etéreo. És, sim, uma espécie de impermeável invisível que me acompanha sempre. Proteges-me mesmo sem eu dar conta. E guias-me os passos independentemente do continente que eu pise. Na verdade, as coisas são assim mesmo e não carecem de grandes explicações.
É como se a jogar ao loto saísse o quinze em vez do almejado dezanove. E mesmo sem quinar (a avó conjugaria outro verbo hilariante…), marcaria aquele número precioso no meu cartão vermelho. Não és, mas estás. Quinze ou dezanove… Se fechar os olhos com força, estás a estender-me a mão numa praia que me é familiar. Olha… talvez faça cartão cheio!
AV

1 comentário:

Unknown disse...

UMA COMOVENTE HOMENAGEM AO TEU PAI. UM FORTE ABRACO.